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Foto do escritorKrishna Grandi

O abraço da sorte

Atualizado: 17 de nov. de 2022

Já foi dado e está raro. Não pode mais se encontrar por aí. Quem ousaria? Um abraço de morte. Nem último suspiro, nem lágrima final. Lá fora está perigoso tocar. O amor foi posto à prova. E a recompensa é o paraíso. Nesses casos de amores impossíveis, arriscados e proibidos, resta o quê?


Toque de recolher. Em casa, encontra-se o reflexo no espelho e a bagunça do quarto. As olheiras de insônia recorrente e o desânimo de contar os dias que não passam. A solidão do próprio umbigo que mata qualquer ser vivo ao redor. Não há plantas, não há gatos, não há borboletas. Nem o beija-flor. Com que flor? Tudo branco e cinza. Tudo em obras e empoeirado. Tudo fechado e pesado.


Na porta ao lado, a videoaula estrangeira abafada. Os olhos pregados, anotando as dicas, construindo frases, repetindo palavras. O que restou de vida lá fora. Preso aqui dentro. Comigo. Não estou só, afinal. Ainda há uma esperança. Outro alguém, diferente do reflexo. Com opiniões e ideias próprias. Alguém para conversar.


Quase estranho, mas é uma sensação de déjà vu. Será que já estava aqui? Parada na porta, ainda sem despertar sua atenção. Ombros curvados, o peso do corpo escorando na batente da porta e apoiando. Preciso cair.


A luz do quarto acende e o calor das cobertas conforta. O chá aquece e o peito transborda. Deitado ao lado, com o semblante de nuvens de algodão doce, o rosto colado ao meu, o abraço de sorte pousado. A fagulha que precisava para incendiar o norte da bússola áurea.

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